Mediação e Conciliação à sua Disposição

Santo André/SP – 22 de junho de 2017
pfsd@grupoitos.com
Por Alan Cristian

1 CONFLITOS
Especialistas estimam que o ser humano tem, diariamente, de 12 mil a 60 mil pensamentos, e que a maioria deles – mais de 80% – é considerada negativa (culpa, arrependimento etc)[1]. Logo, considerando a quantidade de pensamentos negativos, é de se esperar que inúmeros conflitos intrapessoais e interpessoais surjam a partir deles.
De fato, essa expectativa se mostra verdadeira quando se verifica que em 2015 o Poder Judiciário teve de lidar com mais de 100 milhões de processos[2]. E é fato notório que esse número poderia ser ainda maior, se todos os envolvidos em situações conflituosas não deixassem de se socorrer do Judiciário, motivados por razões diversas (a conhecida morosidade da “Justiça”, o alto custo financeiro e emocional de uma “batalha” judicial, entre outras).
Dito isso, é importante combinarmos o seguinte: não se culpe, caso você esteja envolvido numa situação de conflito e não saiba como resolvê-la! Afinal, muitos de nós – se não todos – também passamos pelo mesmo problema em algum momento da vida. Como vimos acima, isso é normal.

1.1. A busca da “Justiça”
Nessas situações, quando não conseguimos encontrar uma alternativa, o Poder Judiciário “chama” para si a responsabilidade de dizer quem tem o direito, o chamado monopólio da jurisdição estatal[3]. E, nesta eventual demanda judicial, em geral, temos à nossa disposição os serviços prestados pelos advogados, que são indispensáveis à administração da justiça[4].
Até aqui, foi descrita a atual cultura brasileira frente ao conflito: a cultura do litígio, da guerra, através da qual as pessoas preferem resolver os conflitos judicialmente a tentarem uma solução entre si[5]. Essa alternativa, também chamada de cultura da sentença, é a solução que predomina no meio jurídico brasileiro.

Apontando o dedo.

Fonte: Pixabay

1.2. Mudança da “cultura da sentença”
Entretanto, essa cultura começa a ser repensada e debatida, inclusive por Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF)[6].
Nesse sentido, a mediação e a conciliação aparecem como boas alternativas, durante a mudança da cultura da sentença por uma cultura mais consensual. Partindo do pressuposto que os conflitos podem ser compreendidos sob um aspecto positivo[7] (de acordo com a moderna teoria do conflito), a mediação e a conciliação utilizam técnicas para auxiliar as pessoas a resolverem os conflitos de maneira amigável.

2 MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO
Mas, afinal, o que são mediação e conciliação?
Nos termos da Lei nº 13.140/2015, que trata da matéria, elas podem ser definidas como uma “atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia”[8]. Em outras palavras, através da mediação e da conciliação as pessoas podem resolver os seus conflitos com a ajuda de uma pessoa imparcial (que não está envolvida na disputa, denominado mediador ou conciliador) que vai auxiliá-las na busca de uma alternativa que satisfaça ambas as partes.

2.1. Diferenças entre Mediação e Conciliação
Resumidamente e de maneira objetiva, uma das principais diferenças entre esses dois métodos autocompositivos de solução de conflitos é a que segue: enquanto a mediação é utilizada nas situações em que as partes envolvidas têm um relacionamento mais próximo e afetivo (por exemplo, assuntos ligados à família, vizinhos, amigos etc.), a conciliação é voltada aos casos que não possuem um vínculo pessoal entre os envolvidos (como é o caso de colisão de veículos no trânsito, assuntos empresariais, relação de consumo etc.)[9].

2.2. Benefícios
Os benefícios de se utilizar esses dois métodos para resolver boa parte dos conflitos são muitos, a saber: as pessoas reassumem o protagonismo na solução dos seus próprios conflitos, elas têm a oportunidade de se colocar no lugar da outra parte e perceber o que lhe aflige, a mediação e a conciliação são mais rápidas e têm um custo mais baixo se comparadas ao conflito judicializado etc[10].

3 RESOLVENDO OS CONFLITOS COM A MEDIAÇÃO E COM A CONCILIAÇÃO
Se você se interessou e quer saber como resolver um eventual conflito, atual ou futuro, de maneira amigável e ainda por cima com mais celeridade e menor custo, prossiga com a leitura.

3.1. Casos que podem ser resolvidos com as técnicas da Mediação e da Conciliação
A lei expressamente determina quais são os casos que podem ser resolvidos numa sessão de mediação ou de conciliação: unicamente os que versam sobre direitos disponíveis ou que tratem de direitos indisponíveis nos quais seja possível a transação[11].
Apenas para brevemente esclarecer os termos utilizados pela lei, direitos disponíveis são, em geral, direitos patrimoniais aos quais o titular pode abrir mão de recebê-los. Por exemplo, o locador pode, por mera liberalidade, abrir mão do aluguel a ele devido em um determinado mês.
Os direitos indisponíveis, em contrapartida, são aqueles dos quais as pessoas não podem abrir mão[12]. Exemplos: direito à vida, alimentos devidos a filhos menores, direitos trabalhistas etc.
Contudo, ainda que alguns direitos sejam indisponíveis, a forma como ele vai ser exercido comporta transação. A lei define transação como concessões mútuas das pessoas envolvidas para prevenir ou terminar o litígio[13]. Por exemplo, os pais não fazem concessões sobre o direito da guarda dos filhos, mas sim sobre o seu exercício[14].

Thêmis.

Fonte: Pixabay

3.2. Advogados na Mediação e na Conciliação
Há ocasiões em que a lei permite que as pessoas optem pela assistência ou não de um advogado[15], nas sessões de mediação e de conciliação. Contudo, ainda nesses casos, é recomendável que se conte sempre com a assistência técnica desse profissional, visando à total proteção dos interesses envolvidos. Haja vista que, ainda que o acesso à justiça seja um direito fundamental[16], o acordo firmado numa sessão de mediação, se não houver nenhuma condição que o torne nulo, é um título executivo, ou seja, ele se tornará obrigatório para as partes. Por isso, é muito importante estar juridicamente assistido, para não fazer um eventual mau acordo.

3.3. A opção pela Mediação ou Conciliação
De acordo com o art. 11, do Código de Ética e Disciplina da OAB, os advogados têm a autonomia para “imprimir à causa orientação que lhe pareça mais adequada, sem se subordinar a intenções contrárias do cliente, mas, antes, procurando esclarecê-lo quanto à estratégia traçada”[17]. Isso implica dizer que é importante que você confie nas orientações dadas pelo seu advogado.
Entretanto, esse artigo não impede que você solicite a assistência do seu advogado para resolver o seu caso através da mediação e da conciliação ou, quando da contratação do advogado, peça para ele optar por tal procedimento.
Aliás, é sempre bom destacar que é dever do advogado “estimular, a qualquer tempo, a conciliação e a mediação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios” (art. 2º, parágrafo único, VI, do Código de Ética da OAB)[18].
Afinal de contas, a mediação e a conciliação são métodos mais rápidos, têm custos mais baixos e visam a pacificação da sociedade; e elas estão à sua disposição!

REFERÊNCIAS

[1] URY, William. Como chegar ao sim com você mesmo. Tradução de Afonso Celso da Cunha. Rio de Janeiro: Sextante, 2015, p. 27.

[2] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA [CNJ]. Justiça em números: ano-base 2015. vol. 1 (Relatório Analítico). Brasília, 2016, p. 13. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/10/b8f46be3dbbff344931a933579915488.pdf. Acesso em: 20 jun. 2017.

[3] BETIOLI, Antonio Bento. Introdução ao direito: lições de propedêutica jurídica tridimensional. 14. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2015, p.144. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br. Acesso em: 20 jun. 2017.

[4] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988: “Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm#art133. Acesso em: 20 jun. 2017.

[5] BARCELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2012 (Coleção saberes do direito ; 53), p. 66. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br. Acesso em: 20 jun. 2017.

[6] JUDICIÁRIO precisa abandonar “cultura da sentença”, diz ministro Dias Toffoli. Revista Consultor Jurídico, 11 de abril de 2017, 17h49. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2017-abr-11/judiciario-abandonar-cultura-sentenca-toffoli. Acesso em: 20 jun. 2017.

[7] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA [CNJ]. Justiça em números: ano-base 2015. vol. 1 (Relatório Analítico). Brasília, 2016, p. 51. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/10/b8f46be3dbbff344931a933579915488.pdf. Acesso em: 20 jun. 2017.

[8] BRASIL. Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particulares: “Art. 1º (…) Parágrafo único. Considera-se mediação a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia”. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm#art1. Acesso em: 20 jun. 2017.

[9] BARCELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2012 (Coleção saberes do direito ; 53), p. 92. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br. Acesso em: 20 jun. 2017.

[10] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA [CNJ]. Justiça em números: ano-base 2015. vol. 1 (Relatório Analítico). Brasília, 2016, p. 148-49. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/10/b8f46be3dbbff344931a933579915488.pdf. Acesso em: 20 jun. 2017.

[11] BRASIL. Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particulares: “Art. 3o Pode ser objeto de mediação o conflito que verse sobre direitos disponíveis ou sobre direitos indisponíveis que admitam transação”. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm#art3. Acesso em: 20 jun. 2017.

[12] DIREITOS indisponíveis. Agência Câmara Notícias, 31 de março de 2008, 14h07. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/119440.html. Acesso em: 20 jun. 2017.

[13] BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil: “Art. 840. É lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas”. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm#art840. Acesso em: 20 jun. 2017.

[14] MARTINS, Gabriela Freire. “DIREITOS INDISPONÍVEIS QUE ADMITEM TRANSAÇÃO”: BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A LEI Nº 13.140/2015. CENTRO DE PESQUISA – CEPES – Escola de Direito de Brasília: Caderno virtual, v. 1, n. 33, 2016, 718, p. 18. Disponível em: https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/cadernovirtual/article/viewFile/1198/718. Acesso em: 20 jun. 2017.

[15] BRASIL. Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particulares: “Art. 10. As partes poderão ser assistidas por advogados ou defensores públicos”. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm#art10. Acesso em: 20 jun. 2017.

[16] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. “Art. 5º (…): XXXV: a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm#art133. Acesso em: 20 jun. 2017.

[17] ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. ANEXO ÚNICO DA RESOLUÇÃO N. 02/2015 – CFOAB. CÓDIGO DE ÉTICA E DISCIPLINA DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – OAB: “Art. 11. O advogado, no exercício do mandato, atua como patrono da parte, cumprindo-lhe, por isso, imprimir à causa orientação que lhe pareça mais adequada, sem se subordinar a intenções contrárias do cliente, mas, antes, procurando esclarecê-lo quanto à estratégia traçada”. Disponível em: http://www.oab.org.br/arquivos/resolucao-n-022015-ced-2030601765.pdf. Acesso em: 20 jun. 2017.

[18] Ibidem: “Art. 2º (…) Parágrafo único. São deveres do advogado: VI – estimular, a qualquer tempo, a conciliação e a mediação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios”.