Entrevista 09 – 09/06/2015

09/06/2015 13h00 (GMT -3)

 

Filósofo
Produz perguntas com um raciocínio mais profundo, mais elaborado

Olá, tudo bem? Eu me chamo Ives Alejandro Munoz. Eu sou Filósofo e Professor Universitário. Sou professor já há 20 anos, aqui na cidade de São Caetano do Sul / SP.


[Escolha profissional]

Eu acho que a principal escolha de eu ter sido Filósofo foi a curiosidade. Foi a mesma que me levou para ciências. Então, antes de eu estudar filosofia, eu acabei estudando ciências na Universidade de São Paulo e, depois de tanto eu acabar estudando ciências, as questões do Universo, todos esses tipos de coisa, acabaram me levando para a Filosofia, que é uma mãe de todas as áreas do conhecimento, né?

E aí eu fui embora, acabei ficando na Filosofia e estou até hoje. 

 
[Função]

A primeira coisa que faz o Filósofo é ser uma pessoa que é apaixonado por conhecer as coisas.  Se você olhar a história da Filosofia, você vai ver que todos os Filósofos eram apaixonados por alguma coisa. Em tempos diferentes, as paixões foram diferentes. Os gregos tinham uma paixão grande pela natureza, pela ordem, pelo cosmos, depois os medievais tiveram uma preocupação mais com as questões de Deus, depois um pouco mais sobre a questão do conhecimento, e hoje, contemporaneamente, o homem.

O Filósofo produz perguntas, produz questões. A questão básica da Filosofia é você levantar questões. Dificilmente você tem um conhecimento pronto, geral, abrangente, definitivo. A Filosofia vive mais de perguntas, só que são perguntas bem elaboradas, são perguntas de um raciocínio mais bem elaborado. A gente costuma dizer que Filosofia é um pensamento profundo. Do quê? Do que você quiser. Você pode falar sobre futebol, você pode falar de poesias, você pode falar de arte, você pode falar de ciência, você pode falar de religião, desde que seja bem elaborado. Um pensamento mais crítico, um pensamento um pouco mais profundo do que o senso comum, do que aquilo que a gente observa no dia-a-dia.

[Áreas de atuação]

Em primeiro lugar a docência, né? Ser Professor, normalmente, é a parte mais comum, é a linha mais comum. Pode ser um Professor de Ensino Médio,  até porque, nós temos na nossa legislação a obrigação de ter a Filosofia no Ensino Médio, seja numa escola privada ou pública, ou um Professor universitário, dependendo da carreira você tem a Filosofia dando uma parte inicial do conhecimento dentro de uma Universidade. Pode ser também como um Consultor, você tem consultoria, por exemplo, na área da política, na área da ética, você tem vários meios de comunicação que gostam de contratar o Filósofo, porque o Filósofo tem um olhar um pouco mais crítico.

Inclusive aqui no Brasil nós temos dois grandes Filósofos que eu tive o prazer de conhecer, que são Filósofos que estão sempre na mídia: que é o Luiz Felipe Pondé, que é colunista da Folha de São Paulo e é Professor da PUC, e o Mário Sergio Cortella, que foi Professor da PUC e hoje é palestrante no Brasil todo. Também existe o ramo das palestras, dos eventos que você pode fazer e aí você pode também falar dentro de empresas, você pode falar sobre as questões da vida, sobre as questões agoniantes das pessoas… Tem inúmeros ramos, né?

[Atividades diárias]

A primeira coisa é você se informar de como está o mundo, você é obrigado a estar interado de como estão as coisas, porque você, o Filósofo vai fazer uma leitura do contemporâneo, então você precisa estar atento ao que está acontecendo, a política, economia, conflitos, conflitos étnicos, avanços da ciência, questões… Então você precisa primeiro estar atento. Depois, você vai obviamente, procurar fazer leituras, então o Filósofo, praticamente, vive em livrarias comprando livros, se aprofundando de autores, você vai ter que conhecer os clássicos, vai ter que se aprofundar nos gregos, em alguns medievais e, a partir daí, começar a produzir textos.

Ou seja, a ideia é também você sentar na frente do computador, produzir material, produzir teses, dissertações e, obviamente, até na publicação de livros.

 

[Formação]

Então, se você olhar os Filósofos antigos, eles não eram Filósofos em sentido acadêmico. A Filosofia, ela nasceu da pergunta, das curiosidades em relação o mundo. É possível fazer Filosofia sem ser acadêmico? É possível. Porque, se você está fazendo uma reflexão profunda sobre um tema, você já está fazendo o exercício da Filosofia. Então, seja na política, seja na economia, seja no esporte, no humor, na estética, não importa, você está fazendo Filosofia.

Agora, logicamente, para você ser um docente, você precisa fazer uma graduação, de preferência, uma Licenciatura em Filosofia, que aí você mescla a parte filosófica com as disciplinas pedagógicas para que aí você tenha um conhecimento melhor na hora de você lecionar. Então, é melhor, é mais interessante.

 

 

[Perfil do profissional]

A primeira coisa é gostar de ler. Você precisa pegar os clássicos, dar uma lida, né? Às vezes são livros muito complicados de você ler, não sai muito facilmente. Precisa gostar de escrever também, ter uma certa facilidade. Gostar de História, porque a Filosofia, ela não está no espaço, ela está sentada na História, ou seja, ela reflete acontecimentos. Então os pensadores, eles vão falar da sua época, né? Do tempo em que viveram.

Então, a matéria prima é, sem dúvida nenhuma, leitura e a escrita. Isso é importantíssimo. E uma boa retórica, falar bem se você é um Professor, obviamente, você precisa falar bem, você precisa se comunicar, precisa ser simples. A capacidade de ser sintético. Isso é importante.

[Profissional bem-sucedido]

Bom, um dos grandes problemas da Filosofia, que eu vejo, é que muitas vezes ela é, ela acaba ficando em um certo clube. Então assim, a impressão que se têm é que o cara produz para ele e para meia dúzia. Os Filósofos que mais se destacaram foram aqueles que tentaram divulgar a Filosofia.

Eu acabei de citar dois que são famosos, porque eles vão à público, eles tentam levar uma ideia, romper uma ideia que a Filosofia é somente uma coisa para poucos, para meia dúzia, e tentar fazer um olhar mais para o público. Claro que vai isso, sempre é muito perigoso, porque você está pegando uma ideia e está transformando ela numa ideia um pouco mais de fácil acesso, mais digerível.

E isso, sempre fazer o resumo, uma simplificação, é sempre problemática que você pode acabar simplificando demais. Mas, uma das coisas importantes é: fazer divulgação e também, a arte de falar bem. Se você não consegue transmitir com facilidade a ideia, você vai ter um problema. 


[Inspiração profissional]

Ah, sem dúvida nenhuma, foram os gregos. Acho que os Filósofos gregos são os maiores inspiradores e, eu posso falar uma coisa que, às vezes, a gente observa na Filosofia, na medida que a gente vai avançando com ela nas questões, é que nós não mudamos muito. As questões que afligem hoje o ser humano, as questões existenciais, da natureza humana, para onde nós vamos, da onde viemos, esse tipo de coisa, são perguntas que sempre existiram. Podem ter mudado uma outra coisa, nós ficamos mais tecnológicos, ficamos um pouco mais ralos em relação a maneira que a gente convive, mas as perguntas são as mesmas. Então, as mesmas perguntas que nós temos hoje, existiam no passado. Mas, os gregos, eles falaram, praticamente, de tudo que existe. É difícil encontrar um tema que os gregos não falaram. Então, quando você pega a figura de Sócrates, por exemplo, ou de Platão, de Aristóteles, de Epicuro, esses caras, eles foram geniais.

O Filósofo Nietzsche, ele costumava dizer isso, que os gregos disseram quase tudo, o resto é nota de rodapé. Eu, particularmente, sou muito, muito fã dos gregos, principalmente, da figura de Sócrates. Sócrates foi o primeiro Filósofo a trazer a Filosofia para o dia-a-dia, ele nunca escreveu nada, ele não deixou nada escrito. Ele andava pelas ruas, conversava com as pessoas, ele parava e perguntava: ‘o que é justiça para você?’, ‘o que é virtude?’, ‘o que é Deus?’. Então, ele fazia uma Filosofia, que a gente chama de Filosofia do dia-a-dia, uma Filosofia de rua, de rua mesmo. Quando a Filosofia se tornou mais acadêmica, quando ela se tornou mais formal, quando ela foi para dentro das universidades, ela se tornou um pouco quadrada, um pouco fechadinha, pareceu que ela ficou presa dentro de uma caixa de sapato. E, a Filosofia, ela é liberta, ela é mais para fora.

Se, os gregos estivessem hoje, por exemplo, no meio de nós, eles iriam achar um horror a gente filosofar dentro de uma sala de aula. Para eles, a gente deveria ser peripatético. O que é peripatético? Pensar e caminhar, filosofar andando, andar, conversar na rua. Essa é a Filosofia mais original, é aquela mais grega possível. 

[Perspectiva da profissão]

Eu acho que vai estar muito bom.

Primeiro que a educação ainda vai precisar muito da Filosofia. E, existe um campo da Filosofia, que é um campo que a gente vai precisar muito, se chama ética. A ética não é só dizer o que é certo e o que é errado, a ética normativa. Mas é dizer como que nós estamos vivendo, como que nós queremos viver no futuro. Nós precisamos de ética o tempo todo. Nós precisamos de ética para saber como gerenciar empresas, nós precisamos de ética para saber como que nós criamos os filhos, nós precisamos de ética para dizer como que eu me comporto na sociedade, que tipo de política eu desejo, então é engraçado, porque quanto mais a gente avança como sociedade, mais a urgência se faz em alguns ramos da Filosofia. Em especial, a ética e a teoria do conhecimento, que é se perguntar como que a gente aprende as coisas, como é que a gente conhece as coisas.

Então, o Filósofo é um campo que voltou, ele ficou muito tempo sem Filósofos no Brasil, nós tivemos a perda da Filosofia na época da Ditadura Militar, do Regime Militar e, a partir de 2007, 2008, começou a volta. Então a gente tem um campo aí grande para gente que quer escrever, pra gente que quer pesquisar sobre a área, para gente que quer falar. Hoje nós temos, por exemplo, conflitos étnicos, religiosos ao redor do mundo. Porque existe então esse fundamentalismo religioso, então o Filósofo pode fazer esse olhar mais crítico, ele pode fazer parte de uma mente escrita ou de uma mídia televisiva e dar o seu ponto de vista, sempre com aquele cuidado de não levar resposta pronta, mas de fazer uma pergunta: “porquê que está havendo isso?”, ”que mundo que a gente quer viver?” e “que mundo que a gente vai deixar?”, “qual é o legado que a gente vai deixar para os nossos filhos e netos?”.

Às vezes, em reuniões assim com os pais, os pais falam: “nossa, o meu filho precisa de ética; a família precisa de valores”.  Não: nós temos valores! A gente precisa é dizer quais são os valores que a gente quer em primeiro, segundo, terceiro, em quarto lugar… Não há falta de valores; valores há! O que a gente precisa saber é colocar uma escala de valores, o que a gente precisa. Como é que a gente constrói um Brasil melhor? Como é que a gente constrói uma sociedade melhor, mais justa, mais igualitária? Esse é um campo aberto ainda. É bem-vindo todo mundo que quiser.


[Remuneração]

Então, como de maneira geral as pessoas começam na docência, você tem de tudo: você tem desde salários que são relativamente baixos, para quem está começando, como salários de professores universitários que não são ruins.

Num colégio do Estado, num colégio municipal você vai ter um salário de R$ 1.800, R$ 1.900, para início (uma carga cheia de aula). E depois, com o passar do tempo, você vai pegando aulas à noite, fazendo uma pós-graduação. E aí, obviamente, o salário vai aumentando.

[Indicação de leitura – Confira em: www.goodreads.com/grupoitos ]

Eu acho que se você quer fazer uma introdução à filosofia, os livros do Mário Sérgio Cortella, sem dúvida, hoje, são os melhores. O Mário Sérgio Cortella tem um livro que eu acho que todo mundo deveria ler, que se chama: “Qual é a tua obra?”. Ele é um olhar, uma reflexão. Ou seja, um olhar para dentro. Aonde você vai se perguntar o que você quer; se você quer ser administrador, da onde vem esse despertar? Qual a tua obra? Por que você veio? Qual é o teu vocare?  Qual é o seu chamado?

O Luiz Felipe Pondé também tem um que é muito bom, que é o “A Era do Ressentimento “; o ” Guia Politicamente Incorreto da Filosofia “. São livros bacanas para uma introdução.

É complicado, às vezes muitos alunos falam para mim: “ah, professor eu queria ler Nietzsche.”. Nietzsche é uma figura polêmica, ou você o ama ou você odeia. Então, Nietzsche é um pouco mais pesado, um pouco mais complicado. Você vai ler o Sartre (“O Ser e O Nada”), vai ler o “Ser e Tempo”, de Heidegger. São filósofos que você precisa ter um pouquinho mais de conhecimento de filosofia, para você ler. Então, às vezes vale a pena pegar um divulgador, como é o caso do Cortella, o caso do Pondé, da Maria Helena Chaui, também da Viviane Mosé; são livros bacanas.

Um o outro se chama “Não nascemos prontos!”: é um excelente livro, do Cortella, que fala que quem nasce pronto é geladeira, microondas, tênis… a gente não. A gente se faz pronto. A gente não nasce pronto, nasce não pronto e fica pronto durante a vida.


[Mensagem Final]

Uma mensagem: olha, a filosofia é uma das coisas mais bonitas que tem; que é a ideia de você contemplar o conhecimento. Quando você começa a se perguntar: “De onde eu vim?”, “Por que estou aqui?”, “Para aonde eu devo ir?”, “Como eu devo agir?”, “Por que eu devo fazer o bem e não mal?”. Quando você começa a levantar essas questões, você começa a ver o mundo de outra maneira. Quando você começa a fazer filosofia, você se apaixona por ela. Você a ama; ela fica companheira. E não importa do que você esteja falando, você vai sempre ter esse olhar filosófico. Lógico que você não vai ser filósofo no meio de um churrasco, no meio de um casamento.

Mas sempre é bacana esse olhar diferenciado. Eu acredito que, para quem faz filosofia, não tem nada mais bonito que aprender e tentar aprender como é que eu conheço aquilo que eu quero conhecer. Ou seja, as perguntas mais originais, mais metafísicas. Esse é o grande troféu.

Você pode passar a tua vida fazendo só perguntas, e aí você fala “nossa, mas não é legal encontrar respostas?”. As respostas são bacanas, mas às vezes as perguntas são mais bacanas, são mais legais.

[Divulgação]

Bom, se alguém quiser saber mais sobre o Filósofo Ives eu tenho uma página no Facebook: Ives Alejandro Munoz. Eu coloco ali as palestras que eu faço. Hoje, eu estou fazendo bastante divulgação de filosofia. Esse projeto se chama FILOSOFANDO, que é filosofar e andar (ando – no sentido de andar: FILOSOFANDO). Eu ando e faço filosofia. Então, costumo fazer bastante palestras em relação a isso. Se você quiser conhecer meu site é www.ivesalejandro.com.br. Tenho um canal no Youtube também, com os vídeos (além da página no Facebook que você pode curtir). Se quiser, fique à vontade para fazer perguntas e terei o maior prazer em responder.

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